terça-feira, 13 de setembro de 2011

Diane Arbus e "A Pele"

Nicole Kidman como Diane Arbus

Como admirador do trabalho da fotógrafa norte-americana Diane Arbus, há muito queria assistir ao filme "A Pele", de Steven Shainberg, lançado em 2006. O subtítulo da obra já deixa claro as intenções do diretor: "Um Retrato Imaginário de Diane Arbus". É preciso enfrentar o filme com a guarda baixa, disposto a aceitar as liberdades do autor - liberdades essas que são a origem de suas maiores qualidades e de seus maiores defeitos.

Diane Arbus, autorretrato, 1945

Diane Nemerov nasceu em 1923, na cidade de Nova York, filha de pais judeus ricos, donos da loja de departamentos Russek's, na caríssima Fifth Avenue. Aos 18 anos, ela casou-se com seu namorado de longa data, Allan Arbus, com quem teria duas filhas. Ambos se interessavam por fotografia, e foram contratados pelo pai de Diane para fazer as fotos promocionais de sua loja. Em 1946, eles abriram um estúdio comercial, com Allan como fotógrafo e Diane como assistente. Eles fizeram fotos para as revistas Vogue, Harper's Bazzar, Seventeen e Glamour, embora odiassem o mundo da moda.


Após estudar fotografia, em 1956 Diane abandonou a moda e começou a fazer trabalhos para publicações mais sérias, como Esquire e The Sunday Times Magazine. Durante os anos 60, ela deu aula na Parsons School of Design e na Cooper Union, em Nova York, e na Rhode Island School of Design, em Providence, Rhode Island. Sua primeira grande exposição ocorreu no Museum of Modern Art, em 1967, junto aos fotógrafos Garry Winogrand e Lee Friedlander.



Arbus sempre teve interesse em retratar pessoas comuns de forma crua, certamente em contraposição aos anos trabalhando com moda e à sua própria experiência como a menina rica filha dos donos da Russek's, um templo de luxo e ostentação. Isso acabou levando-a a retratar doentes mentais, prostitutas, anões, nudistas e travestis, entre outros outsiders, fazendo com que ela fosse rotulada, de certa forma injustamente, como a "fotógrafa das aberrações".



Sua obra vai muito além disso, alcançando uma dimensão psicológica do retratado como nenhum fotógrafo havia feito, misturando estranheza e proximidade, além da acuidade cromática - a dramaticidade dos contrastes em preto e branco e a suavidade dos cinzas. Sua fotografia, contudo, recebeu tanto elogios quanto críticas pesadas - a escritora e feminista australiana Germaine Greer, retratada por Arbus em 1971, disse que seu retrato era "indiscutivelmente ruim" e que o trabalho dela era pouco original e preocupado apenas com "a imperfeição e a desilusão humanas". Outros, como o grande crítico Robert Hughes, viam a sua obra como revolucionária.



Diane Arbus, já separada de Allan desde 1958, sofria de depressão (segundo ele, ela tinha "mudanças violentas de humor") e suicidou-se em 26 de julho de 1971, ingerindo barbitúricos e cortando os pulsos. Ela tinha 48 anos.


"A Pele" merece ser elogiado por não ser uma cinebiografia tradicional e "careta", mas essa opção arriscada de Shainberg acaba por afastar excessivamente sua personagem da verdadeira Diane Arbus, e embora a personagem de Nicole Kidman tenha uma trajetória interessante, ficamos nos perguntando o quanto ela tem da fotógrafa nova-iorquina. O filme se detém demasiado numa Kidman titubeante, ansiosa por deixar para trás sua vida social medíocre e assumir algo que ela não sabe bem o que é, mas que no filme se materializa no vizinho Lionel Sweeney, que sofre de uma doença rara chamada hipertricose, que faz com que ele tenha o corpo totalmente coberto de pelos. A partir daí, o filme se concentra no relacionamento dos dois, cada vez mais íntimo, e nos problemas que naturalmente surgem na vida familiar dela. Sweeney também a apresenta a um mundo de freaks como ele, uma referência às famosas fotos de Arbus.

Nicole Kidman e Robert Downey Jr.

Um dos pontos altos do filme são as atuações de Kidman e Downey Jr., dois atores excepcionais. Ele, em especial, consegue passar uma gama de emoções e gerar empatia tendo, como ferramenta, apenas o olhar e o tom de voz. Nicole, em 2006, ainda sem o Botox que destruiria a sua expressão, é de uma beleza e de uma doçura estonteantes. O que vemos nos 122 minutos de filme é uma história de abandono e de encontro, de esperanças e de tristeza, embalada por uma fotografia belíssima. No entanto, a opção do diretor de deixar de lado os fatos e se concentrar num evento fictício - com o propósito de investigar os reais motivos da atração de Arbus pelo proibido e pelo estranho - é apenas uma conjectura, e terminamos com a incômoda sensação de que não conhecemos quase nada dessa grande fotógrafa que foi Diane Arbus.


Para ver um álbum com imagens da fotógrafa, clique no link na barra ao lado (o retrato de Germaine Greer está na página 77)

Clique abaixo para assistir ao documentário sobre Diane Arbus da série Masters of Photography (em inglês, sem legendas):

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